21.8.11

ode a Lisboa

Lisboa é uma história branca.
Portugal é uma não-existência cinza.
O Mundo é um mero muro negro.

Lx, 21-08-2011

seres heterónimos

quantos outros Fernandos Pessoa existirão numa só Lisboa? quando detecto numa rua, num subterrâneo, num edifício qualquer, alguém que engana com os olhos, lamento a melancolia que neles consigo respirar.

são eles os que vadiam pela vida suportando os seus sonhos apagados sonhando com outros reinos onde são césares; são os que reparam que o rio adormeceu até mais tarde que o costume; os que observam os olhos-expressão alheios.

são um grupo restrito, duma exclusividade que nem eles desejaram.

eles são os escritores que não sabem escrever mas sentem as palavras inexistentes. são os anónimos amantes da vida expiada pelo poder apodrecido.

são eles os que veêm o mundo gramaticalmente paralelo.


sem data mas de à uns dias atrás, Lx

20.8.11

a matéria do sonho

associa manchas a formas perceptíveis e adivinha nelas cores que são mera imaginação das crianças. afinal o que são as cores senão uma ilusão ocular a que chamamos realidade quando nem a mentira é detectada?

a narração é formada pelas linhas de pensamentos desconexos, outra ilusão da história contada por nós erradamente confusos e iluminados.

duram segundos compactados de convulsões neuronais e espasmos visuais, mas atribui-lhe, o cérebro, uma duração longínqua criada pela sua mentira inconsciente e inocente.

cada som que se desenrola é surdo, não existe, é apenas uma recordação do tímpano que passamos a ver somente.

e no final do dia, quando começamos, de sentidos dormentes, a murmurar o nevoeiro ritmado das sinapses erráticas que reconhecemos e cumprimentamos, lembramo-nos que temos medo. não queremos exprimentar uma outra venenosa dose da nossa própria pureza; algo que não existe mas que nos é todo.

no entanto, o nosso automatismo cerebral apaga-nos estas memórias do que realmente somos, protegendo-nos (talvez?) da nossa essência que nos poderia consumir por tão absolutamente ser.

é lei universal que não podemos saber-nos inteiramente e ainda menos pensarmos com identidade original. Tendo sido a nossa alma que a criou.


Galé, 02-08-2011

bons-dias

no fundo da chávena

segue os buracos na calçada